SÓCRATES E A CONCEPÇÃO DO FILÓSOFO EDUCADOR
*Maria Ivanilda Souza da Silva
A filosofia socrática tem como característica principal ser antropológica, do grego anthropos (homem) e logos (teoria ou ciência), nesse sentido, ela se constitui como um estudo do homem.
Sócrates é considerado como um marco divisor da filosofia, pois retirou o foco da investigação filosófica da physis (natureza), para o homem. Antes dele, os chamados filósofos pré-socráticos queriam determinar qual o arqué (princípio) que deu origem a todas as coisas, queriam desvendar a ordem do universo. Mas, para Sócrates antes de tentarmos compreender o mundo que nos cerca, devemos em primeiro lugar, compreender o próprio homem, quem ele realmente é, qual a sua natureza.
A pergunta essencial levantada pelo pensamento socrático é a seguinte: o que é o homem? Para responder a esse questionamento ele se propôs a observar todas as características humanas, objetivando encontrar nelas aquilo que fosse comum a todos os homens, e a conclusão chegada por ele foi que, o homem é a sua psyché (alma = razão), pois a razão é o elemento comum a todos nós, e principalmente, é ela quem nos diferencia de todos os outros seres.
Se a parte essencial do homem é a razão, então ela deve ser colocada sempre em primeiro plano. A razão é quem deve comandar as ações humanas, mas para dirigir essa conduta fazendo sempre as melhores escolhas ela deverá estar bem alimentada pelo conhecimento, pois somente este, proporcionará a eliminação dos erros e das falsas opiniões. Mas, para atingir o conhecimento, Sócrates propõe um método específico de educação, que correspondia a duas etapas principais: a ironia (em grego, “interrogação”) e a maiêutica (em grego, “parto”). Na primeira o filósofo educador através de perguntas inteligentes busca demolir nos discípulos as certezas cristalizadas, o falso saber. Através da ironia chega-se ao reconhecimento do não saber. Para chegar a tal resultado era preciso fazer uma análise interior, o que Sócrates chamava de “Conhece-te a ti mesmo”. O jogo de perguntas e respostas fazia com que aos poucos o interlocutor passasse por um processo de purificação ao eliminar a arrogância e a presunção do saber, abrindo caminho para o segundo passo a maiêutica, ou seja, com o aprofundamento dos questionamentos o indivíduo “dará a luz” a novas idéias que já se encontram no seu íntimo.
A segunda parte do método de educação socrática, a maiêutica, foi inspirada na profissão de sua mãe, uma parteira que ajudava as mulheres grávidas a trazerem à luz as crianças que já se encontravam concebidas em seu ventre. Por isso, a função da parteira é ajudar no processo de nascimento da criança, mas para isso, a mãe deverá contribuir com um grande esforço para que o parto seja bem sucedido.
Portanto, ao fazer uma analogia entre a função do filósofo com a da parteira, Sócrates queria mostrar que a tarefa do educador é de auxiliar, pois para ele, o conhecimento não é algo que vem de fora para dentro, não é o mestre quem ensina ao aluno, em sua concepção ninguém ensina nada a ninguém, por isso, o filósofo educador também é um parteiro. Não um parteiro de corpos, mas de almas, é seu papel auxiliar os discípulos a “darem a luz” as suas próprias idéias, a construírem o seu próprio conhecimento, assim, a função da filosofia seria construir consciências críticas, autônomas, não meros “papagaios de piratas”, repetidores de idéias alheias. Mas, também aqui, é necessário por parte do educando um grande esforço, já que o conhecimento não cai do céu, para construí-lo é preciso amá-lo e desejá-lo.
*É filósofa, professora e vice-presidente da Academia Acriana de Filosofia.